"Uma mão e pé direito no social democrático e um pé e mão esquerda no social liberal com uma cabeça ambidestra"
terça-feira, 25 de agosto de 2009
Catar feijão
1.
Catar feijão se limita com escrever:
joga-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo:
pois para catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.
2.
Ora, nesse catar feijão entra um risco:
o de que entre os grãos pesados entre
um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a como o risco.
De João Cabral de Melo Neto
Preciso ver-te
como Pégaso que busca o sol,
ainda que tua proximidade me derreta,
pois talvez seja este o meu destino.
Preciso ver-te,
ou serei viajante sem bússola,
carcereiro de mim mesmo,
cego sem horizontes nem auroras.
Preciso ver-te
para que possa encontrar algum sentido
nas coisas e seres que me rodeiam
e que falam de ti como miragem.
Preciso ver-te.
Barco na tempestade, nada temerei
se tu, meu farol intermitente,
me guiares com teu código de luz.
Porque só sei amar às claras,
não vou contentar-me com o obscuro.
O vulto imaginado, sem essência,
acaba se desvanecendo e cria um vazio,
somatório de muitos nadas.
Por tudo isso, preciso ver-te e provar-te,
saber-te real, vívida, palpável,
como também o é o meu amor, que ingeres,
escondida, em tua mesa de silêncio.
Por que tardas,
se tanto sabes que preciso ver-te ?
( de Solange Rech)